Eu quero compor um poema duro
Como poeta algum ousaria escrever.
Eu quero pintar um soneto escuro,
Sério, abafado difícil de ler.
Quero que meu soneto, no futuro,
Não desperte em ninguém nenhum prazer.
E que no seu maligno ar imaturo,
Ao mesmo tempo saiba ser, não ser.
Esse meu verbo antipático e impuro
Há de pungir, há de fazer sofrer,
Tendão de vênus sob o pedicuro
Ninguém o lembrará: Tiro no muro,
Cão mijando no caos, enquanto Arcturo,
Claro enigma, se deixa surpreender.
CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE (50/60)
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